domingo, 29 de dezembro de 2013

Não julgue um fato isolado, mas o contexto.

Foto: Banco de imagens do Google

Eu tinha um amigo que ia para a escola todos os dias pelo mesmo caminho. A certo ponto do trajeto, havia uma casa com portões de grade com um cachorro muito bravo. Ele provocava o cachorro todos os dias. Parava, acenava para o cachorro, colocava a mão próximo à grade numa distância que o animal não alcançasse. Irritava o bicho até deixá-lo babando de raiva. Não sei qual dos dois era o mais animal. O meu amigo com certeza era o que tinha a atitude mais idiota. Todas as vezes que ele passava, parece que o cachorro já o estava esperando, para latir e ser provocado. Só de ver o meu amigo, o cachorro se transformava. Pois bem, um dia, acho que a dona do cachorro já estava de saco cheio daquela situação e deve ter deixado o portão encostado, mas não fechado. Pode ter sido apenas um "descuido". Quando meu amigo se aproximou para sua "diversão" diária, o cachorro correu para o portão semi aberto e avançou nas pernas do meu amigo. Deu várias mordidas e, por sorte a dona chegou e puxou o cachorro para dentro. A calça foi rasgada pelos dentes do cachorro e haviam sinais de belas mordidas. Meu amigo fez um grande escândalo e disse que iria processar a dona do cachorro e que ela iria ter que pagar-lhe uma calça nova. Onde já se viu, deixar um cachorro bravo solto!!! A dona, pacientemente se desculpou e mostrou o comprovante de vacina do cachorro. O assunto se encerrou por ali e meu amigo nunca mais passou em frente ao tal portão. Se eu fosse um juiz, com certeza daria ganho de causa para o cachorro, visto que era uma fúria acumulada de tantos meses de provocação. O cachorro foi o mais inocente e a maior vítima naquela história toda.
Quando eu morava na chácara, sempre comíamos juntos... Eu e meus irmãos. Não ligava para os peidos do meu pai, nem para o jeito barulhento de comer do Seu Arnaldo, o primo do meu pai que morava com a gente. Só havia uma coisa que me incomodava muito: Nunca gostei de arrotos à mesa. Tenho uma sensação horrível quando alguém arrota na mesa. A impressão que tenho é que a pessoa está vomitando gases gástricos sobre a comida que estamos comendo. Meu irmão Toninho sempre teve essa mania idiota de arrotar à mesa. Não sei se era para me provocar, pois sabia que eu não suportava esse tipo de coisa... "Cara eu não posso ficar segurando um arroto. Faz mal. É uma coisa tão natural..." E dava um sorriso cínico. Muitas vezes me desentendi com ele por causa disso. O engraçado é que ele não fazia esse tipo de coisa na frente dos meus pais.
Os anos se passaram e tivemos que morar juntos no Japão. Na época, aconteceu uma coisa muito desagradável, que ele conta como se eu fosse a pessoa mais estúpida do mundo, mas existem coisas que tem duas versões. Antes de alguém se doer por causa das minhas reações explosivas, avaliem a minha versão também.
Trabalhávamos numa empresa chamada Yutaka Denshi. Ele fazia umas duas horas extras. Ia embora cedo e conseguia descansar relativamente bem. Eu fazia de três a seis horas extras na época e voltava para casa só o bagaço. Só dava para jantar, tomar banho e dormir para tentar descansar, pois a jornada se repetia no dia seguinte. Quando estou muito cansado, geralmente acordo calado e de mal humor. Odeio aquelas perguntas idiotas: "Que cara é essa? Parece que não dormiu bem... Por quê você não fala? O gato comeu a sua língua? Quando não estou bem, ou não gosto de uma situação, pela minha cara já dá para perceber...
Sentamos e começamos a comer. Em dado momento ele deu um arroto bem sonoro, seguido daquele riso cínico. Não aguentei... Surtei... Tive uma reação explosiva. Joguei a tigela de comida nele, chutei a cadeira e virei a mesa... Naquele dia entramos no meu carro (ele ia trabalhar de carona comigo) sem trocar uma palavra. Fui trabalhar com fome. Tal qual o cachorro, as vezes me sinto como uma bomba relógio, mas as pessoas vivem testando a minha paciência.

quinta-feira, 26 de dezembro de 2013

As cinzas do Natal

Foto: Banco de imagens do Google

Quando a gente é criança, tende a ouvir determinadas palavras, ou termos e interpretá-los ao pé da letra. A primeira vez que ouvi o termo ''chá de bebê'', achei que iam pegar a água da banheira e fazer chá, rsrsrsrs... Sei lá, algum tipo de simpatia...
Um dia minha mãe me disse que a Quarta-feira de cinzas acontece depois do carnaval. Quarta-feira "de cinzas"? A ideia que me vem na cabeça até hoje é um gari varrendo toda aquela bagunça de confetes, serpentinas e todo o lixo que as pessoas jogam na rua... Junta tudo num canto e toca fogo... Daí as cinzas... Essa imagem mental se afirmou em minha mente de tal forma, que quando imagino o fim de algo, não consigo dissociar da questão de queimar e transformar em cinzas...
Quando eu era criança, sentia uma espécie de entusiasmo com a proximidade do final do ano. Apesar da infância pobre, minha mãe sempre fazia algo especial. Assava frango, fazia salada de batatas. Alguns amigos vinham comemorar com a gente. Era uma época em que o meu inferno doméstico de certa forma dava uma trégua... Eram os poucos momentos em que me sentia Feliz de verdade. Não era somente por causa da comida, mas pela reunião, pela alegria dos risos espontâneos e por saber que apesar de tudo, estávamos comemorando o nascimento de Jesus. Eu agradecia a Ele por tudo aquilo de bom, mesmo que por alguns dias... Imaginei que depois de adulto, apesar de toda a luta, ao menos a alegria de comemorar o Natal e o Ano Novo eu teria... Ledo engano. As vezes acho que não sou dono do meu destino. Conto nos dedos as poucas vezes que comemorei alguma coisa. Até certo ponto da minha vida eu me conformava, visto que trabalhava e sonhava com dias melhores. Hoje percebo que remei muito e me privar de algumas dessas alegrias não valeu a pena. As pessoas talvez nunca saberão o quanto esse tipo de coisa é importante para mim. Hoje até eu mesmo me incomodo com a minha apatia diante da vida, sabe por quê? Por que percebi que até uns poucos meses atrás eu trabalhei muito, mas não fui reconhecido. Fiz muitos sacrifícios, mas parece que as coisas passaram a não mais valer a pena. Parece que eu estou somente trocando seis por meia-dúzia e empurrando a minha vida ano após ano nesse país que se tornou a minha segunda pátria, mas que não me deixa Feliz. Agradeço muito a Deus pela chance de vir para cá e ter tido condições de construir a minha vida, mas vejo que a cada dia, eu estou morrendo por dentro, mas ninguém está nem aí. Na verdade cansei de servir de instrumento nas mãos de todo mundo. Ontem ouvi algo sobre mim que me deixou muito chateado:
"O Denis não ajuda as pessoas por que ele é bom, mas porque o ego dele precisa de aplausos..."
Na verdade, eu fico chateado, mas já não me decepciono com mais ninguém. Esses ano, ouvi tanta merda que a cota de sandices vindas de outrem já extrapolou.
Já faz dois dias que o Natal passou. Hoje é o meu último dia de trabalho na Belltech neste ano. Como nos anos anteriores, meu Natal foi uma bosta, e a previsão para o Ano Novo parece que não será diferente. Não fosse a empresa me dar um bolo de final de ano, o meu Natal teria passado em branco. Tudo bem, vou lutar e esperar por dias melhores. Quero me programar para ir embora em definitivo no primeiro semestre do ano que vem, se Deus me ajudar. No momento, só me resta varrer as cinzas do Natal.

domingo, 22 de dezembro de 2013

Visita ao Museu da Telha

Foto: Arquivo pessoal

Localizado na cidade de Takahama, bem no cruzamento da ponte de Handa, encontrei por acaso, o Museu da Telha... Fiquei curioso e achei que seria interessante conhecer mais esse lugar, não só para acumular horas de atividades complementares para a faculdade, mas também  para colher impressões sobre um museu tão peculiar. O prédio, bonito e de linhas modernas guarda uma das tradições da região. Ali, na região onde ficam as cidades de Takahama, Handa e Hekinan, existem muitas fábricas de telhas que produzem seus produtos a muitas gerações e desenvolveram um forte Know-how no segmento. A região produz telhas para o consumo do país inteiro. Bem em frente à escola em que faço estágio atualmente (Escola Alegria de Saber), tem uma fábrica de telhas com um galpão cuja fachada diz: 屋根技術研究所 (Yane Gijutsu Kenkyu-jo) = Laboratório de tecnologia em telhas. Isso mostra o quanto os japoneses são minuciosos com os produtos que produzem.


Um fato que é gritante com relação a atividade de produzir telhas, é que não é só uma questão de fabricar, mas de criar peças artesanais, mesmo que em grande quantidade, com um grande apelo estético. Notamos a preocupação não somente com a parte prática, que é cobrir edificações, mas também a parte estética, onde telhas em conjunto com elementos de tapar frestas e peças de caráter decorativo formam conjuntos harmoniosos, concebendo um resultado que salta aos olhos. Os japoneses são extremamente supersticiosos e a arte, religião e conceitos de Feng-shui se refletem de maneira clara também em sua arquitetura. 
No Japão, as casas são construídas dentro de determinados padrões, observando-se os pontos cardeais. Em casas antigas e mesmo templos, mansões e castelos, podemos encontrar figuras de peixes, carrancas e outros animais. Muitos desse elementos guardam a significação contida nos símbolos japoneses, como a carpa que remete à ideia de força, coragem e persistência. Alguns telhados possuem detalhes como a flor de Lótus, que indica pureza e iluminação. O macaco, que significa inteligência e astúcia. Uma imagem muito comum é o Oni, carranca de demônio que é colocada nos telhados para fastar os mal espíritos. Contraditório, né.
(Fotos: Google imagens)

Pessoal, desculpem as imagens. Algumas fotos tirei com o meu I-fone, mas infelizmente dentro do Museu não é permitido tirar fotos, então tive que complementar usando imagens do site do Museu.
Para quem quiser conferir mais algumas impressões sobre o museu, segue o link:


O museu abre espaço para outras exposições e é um programa cultural relativamente barato. O estacionamento é gratuito. A exposição da ala de telhas custa meros 200 Ienes (menos do que duas latinhas de Coca-cola). Caso o visitante queira visitar a exposição itinerante da época, mais a exposição das telhas a entrada sai por 600 Ienes. Estudantes até o ginasial não pagam.
Na ala de exposições estão amostras de telhas de vários templos famosos. Podemos observar que a telha na antiguidade era artigo de luxo e  não estava acessível para qualquer pessoa, visto o requinte com que eram produzidas. Podemos encontrar telhas esculpidas em material semelhante à pedra, telhas de porcelana, telhas com acabamento semelhante à louça e muitos outros tipos. Por se tratar de material encomendado aos artesãos  da época não é de se admirar que muitas edificações tenham telhas exclusivas

Para quem está a procura de emoções, ou diversão, o Museu da Telha  não é a melhor opção. Um visitante menos atento pode fazer a visita em 15 minutos. Para aproveitar a visita, é necessário estar com a mente aberta e receptiva às impressões. É necessário paciência e desprendimento para sentir todas as nuances e perceber cada detalhe dessa arte milenar. Ao menos para mim, a visita foi válida pelo acréscimo de informações e de bagagem cultural. Uma pena as peças estarem expostas dentro de vitrines. Meus dedos coçam de vontade de tocar e sentir a textura.
Além do Museu, o visitante poderá desfrutar o jardim ao redor do edifício com peças artísticas decorando o ambiente. Há também um templo ao lado onde há uma estátua que me pareceu ser um Buda. Vale a pena dar uma esticada, pois o ambiente nos transmite um ar de Paz e serenidade.